É comum entre os idosos a presença de uma ou mais doenças crônicas concomitantes o que requer especial atenção tanto no acompanhamento de tais condições quanto na prevenção de incapacidades.
Essas doenças, quando apresentam complicações ou são inadequadamente acompanhadas, podem ocasionar seqüelas incapacitantes que comprometem a autonomia e a independência da pessoa idosa para o desempenho de suas atividades do dia-a-dia o que, sem dúvida, terá importante repercussão em sua qualidade de vida.
A presença de dificuldades no desempenho das atividades cotidianas (por questões físicas, mentais ou ambas) pode gerar a necessidade de outra pessoa para auxiliá-lo. A essa pessoa costuma-se denominar “cuidador”. Cuidadores de pessoas idosas são definidos como “as pessoas que cuidam de pessoas idosas com dependência, desenvolvendo ações que promovam a melhoria da sua qualidade de vida em relação a si, à família e à sociedade. Suas ações fazem interface principalmente com a saúde, a educação e a assistência social e devem ser pautadas pela solidariedade, compaixão, paciência e equilíbrio emocional”. Os cuidadores podem ser familiares, agregados à família ou profissionais contratados especificamente para esse fim. Essa seção do Portal será, a partir de agora, dedicada a essas pessoas e aos assuntos a elas relacionados.
Aos cuidadores é designada a função de auxiliar as pessoas idosas no desempenho de suas atividades cotidianas que, comumente, são denominadas atividades de vida diária. Essas são as atividades que realizamos em nosso dia-a-dia e que, normalmente, não exigem atenção especial para seu desempenho. Assim, por exemplo, quando acordo pela manhã costumo levantar, dirigir-me ao banheiro para meu cuidado pessoal, banhar-me, higienizar-me, vestir-me, dirigir-me à sala de refeições para ingestão do café da manhã e, posteriormente, dirigir-ma ao meu trabalho utilizando, por exemplo, um meio de transporte público como ônibus ou metrô. Enquanto desempenho essas atividades de forma progressiva, tendo a estar pensando em meus afazeres durante o dia e em sua organização pois, afinal, sou uma pessoa independente. Quando, ao contrário, ao acordar pela manhã, necessito pensar, de que modo poderei levantar? Em qual pé poderei me apoiar com segurança? Quem estará disponível para auxiliar-me no banho e a que horas isso ocorrerá? Que roupa poderei vestir já que não consigo mais abotoar camisar com botões pequenos, subir sozinho(a) o zíper de minhas calças ou calçar uma meia? Caso essa situação se apresente, minha capacidade para me autocuidar está comprometida e eu necessito de alguém, uma pessoa presencial, que me auxilie. Eu necessito de um “cuidador”.
Até muito recentemente, a função de “cuidador” era exercida quase que exclusivamente por membros familiares que se disponibilizavam, voluntariamente ou por exclusiva ausência de outras opções, a assistir seus parentes que necessitassem de auxílio. Usualmente era esperado que, por exemplo, os filhos cuidassem de seus pais quando eles envelhecessem e assim necessitassem. Quando um cuidador está disponível, a carga sobre ele pode ser muito significativa. Estudos mostram que a maioria das famílias cuida de seus membros mais dependentes tão bem e pelo maior período de tempo possível. Quando, no entanto, os cuidadores alegam ter chegado ao fim de todas as suas capacidades assistenciais, a institucionalização pode ser a única opção de auxílio disponível.
É assim, necessário, que outras opções assistenciais sejam oferecidas às famílias visando auxiliá-las efetivamente no cuidado de seus parentes mais dependentes e assim permitir que esses continuem a residir conjuntamente. Quando os cuidadores familiares alegam ter chegado ao fim de todas as suas capacidades assistenciais dois desfechos são esperados: institucionalização ou negligência. Neste contexto, a figura do cuidador profissional passa a ser uma força complementar urgente, necessária e indispensável na assistência a essas pessoas.
É impossível precisar quantas são, hoje, as pessoas mantidas em domicílio que necessitam de um cuidador bem como, quantos e quem são estes cuidadores e de que forma estão desempenhando suas atividades.
Programas de orientação de cuidadores surgiram em diferentes âmbitos, federal, estadual e municipal e junto com eles, muitos questionamentos, em especial os relacionados a quais atividades podem ou não ser delegadas a essas pessoas, como e quem poderá adequadamente orientá-las e como poderá ser desenvolvida uma rede de atenção adequada e suportiva às demandas das pessoas idosas, seus familiares e os próprios cuidadores.
Atualmente os cuidadores aparecem como “ocupação” na Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), disponível em https://www.mtecbo.gov.br, no grupo 5162 - Cuidadores de crianças, jovens, adultos e idosos. A ocupação é denominada “Cuidador de idosos” (código 5162-10)tendo como sinônimos “Acompanhante de idosos, Cuidador de pessoas idosas e dependente,Cuidador de idosos domiciliar, Cuidador de idosos institucional, Gero-sitter”. Sua função primária é descrita como “Cuidar de idosos, a partir de objetivos estabelecidos por instituições especializadas ou responsáveis diretos, zelando pelo bem-estar, saúde, alimentação, higiene pessoal, educação, cultura, recreação e lazer da pessoa assistida”. Está claro na CBO que essa ocupação não integra a família no 3222 - técnicos e auxiliares de enfermagem - minimizando quaisquer dúvidas que possam ser levantadas pelos conselhos profissionais respectivos.
As atividades descritas e suas especificações envolvem:
Esssa publicação data de 2002 e, atualmente, exige revisão em especial quanto a descrição da formação e da escolaridade necessária à função. Especialistas na área de gerontologia preconizam que o cuidador profissional deva ter, no mínimo, o equivalente denominado “primeiro grau” diferentemente de um cuidador familiar que, muitas vezes, pode ser analfabeto. Discussões recentes junto ao Ministério da Saúde acerca da formação preconizam que cuidadores profissionais devem ser capacitados em cursos de, no mínimo, 160h teórico-práticas com conteúdo abrangente e específico relacionado a envelhecimento e cuidado da pessoa idosa.
Está tramitando em nível federal o Projeto de Lei nº 6.966/2006 de autoria do deputado Inocêncio de Oliveira, que dispõe sobre a criação da profissão de cuidador. Em nossa próxima coluna estaremos discutindo o teor desse projeto que, em primeira análise, parece vir para contribuir para a regulamentação dessa atividade, em crescente expansão.
Referências
Gerontóloga, Professora Livre-Docente da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, criadora do Primeiro Curso de Graduação em Gerontologia do Brasil (Escola de Artes Ciencias e Humanidades da USP)